A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado aprovou, nesta quarta-feira (13), a proposta de emenda à Constituição (PEC) que criminaliza a posse e o porte de drogas ilícitas em qualquer quantidade. O texto foi aprovado em votação simbólica, sem contagem nominal de votos. A PEC segue para o plenário do Senado e, se aprovada, será enviada para a análise da Câmara.
Quatro senadores pediram para registrar voto contrário ao texto: Marcelo Castro (MDB-PI), Fabiano Contarato (PT-ES), Jaques Wagner (PT-BA) e Humberto Costa (PT-PE).
O tema também está em debate no Supremo Tribunal Federal (STF): a Corte deve decidir se é crime uma pessoa portar maconha para consumo próprio – essa discussão não tem a ver com a legalização de drogas ou liberação de entorpecentes.
Iniciado em 2015, o julgamento foi retomado no último dia 6. Quando o placar estava com 5 votos favoráveis à descriminalização do porte de maconha para uso pessoal e 3 votos contrários, o ministro Dias Toffoli pediu mais tempo para análise, e a análise foi adiada mais uma vez (sem data para voltar à pauta da Corte).
A diferença entre o que está sendo discutido pelo STF e o que a CCJ aprovou é a seguinte:
?? O STF discute descriminalizar o porte de pequenas quantidades de maconha. Ainda não há maioria formada nesse sentido. Caso se decida pela descriminalização, os ministros ainda têm que definir quantos gramas seriam permitidos.
?? O texto da PEC aprovada nesta quarta na CCJ do Senado não especifica a que droga ele se refere – diferente do que está em análise no STF, que trata exclusivamente da maconha –, mas fala em "drogas ilícitas". Ao criminalizar até mesmo o porte de pequenas quantidades, a proposta prevê que o cidadão pego nessas condições seja punido com penas alternativas à prisão. Elas podem prever, por exemplo, medidas socioeducativas.
Quando o STF retomou o julgamento da descriminalização do porte de maconha, no ano passado, o Senado alegou que o tribunal estava legislando no lugar do Congresso. Já a Corte diz que o Congresso se omite nesse tema.
Lembrando que criminalizar a prática, nesse caso, não significa levar a pessoa à prisão, mas sim fazer o registro na ficha criminal.
A PEC aprovada na CCJ é uma reação dos senadores ao julgamento no Supremo.
A Lei de Drogas, de 2006, estabelece, em seu artigo 28, que é crime adquirir, guardar e transportar entorpecentes para consumo pessoal. No entanto, a legislação não fixa uma pena de prisão para a conduta, mas, sim, sanções – como advertência, prestação de serviços à comunidade e aplicação de medidas educativas (essas duas últimas pelo prazo máximo de cinco meses).
Dessa forma, a norma despenaliza o porte de drogas para consumo próprio – sem, contudo, legalizar a conduta. Se aprovada, a mudança na Constituição proposta na PEC do Senado irá classificar essa conduta como crime.
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A PEC foi apresentada pelo presidente do Senado, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e tramitou na CCJ sob relatoria do senador Efraim Filho (União-PB).
No relatório aprovado pela CCJ nesta quarta, Efraim alterou o texto de Pacheco para incluir uma emenda do senador Rogério Marinho (PL-RN) que diferencia traficantes e usuários.
O trecho possibilita que o usuário seja punido com penas alternativas à prisão e encaminhado para tratamento contra a dependência química – mas não define qual quantidade de droga diferencia usuários e traficantes.
"Essa medida tem como finalidade manter a criminalização sem, contudo, afastar os usuários da busca por tratamento à saúde, além de distingui-los dos traficantes de drogas, para os quais a legislação já prevê a aplicação da pena privativa de liberdade", escreveu Efraim no documento.
Com a aprovação do relatório na CCJ, a PEC pretende inserir no artigo 5º da Constituição o seguinte texto:
"A lei considerará crime a posse e o porte, independentemente da quantidade, de entorpecentes ou drogas afins sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, observada a distinção entre o traficante e o usuário, por todas as circunstâncias fáticas do caso concreto, aplicáveis a este último penas alternativas à prisão e tratamento contra dependência".
Durante a sessão, Efraim criticou indiretamente o fato de o Supremo Tribunal Federal estar analisando uma ação sobre o mesmo tema – e ter decidido fixar, no julgamento, a quantidade máxima de porte para diferenciar o usuário e o traficante.
"[...] Foi decidido e deliberado na reunião de líderes que era um posicionamento que precisava ficar muito forte, né? O foro adequado para que se trate situações dessa natureza que poderá ou não levar a discriminalização da droga no Brasil. O foro adequado é o parlamento, é aqui onde estão as pessoas que foram eleitas e escolhidas pela população para representá-las em situações dessa natureza", afirmou.
"O parecer vai nesse sentido e o parecer reforça duas posições para manter a posição contrária a essa descriminalização. Primeiro, o pilar da saúde pública, segundo o pilar da segurança pública", disse.
O senador Fabiano Contarato (PT-ES), em seguida, defendeu a posição do STF e criticou a PEC em votação.
"Eu fui delegado de polícia por 27 anos e essa PEC não inova em absolutamente nada. Sabe por quê? Nós temos uma população carcerária no Brasil, dados, ela saltou de 58,4% para 68,2% de pessoas pretas, de pessoas pardas. Nós temos aqui que um branco no Brasil, para ser definido como traficante, ele tem que ter 80% de substância a mais que um negro. É o Estado criminalizando a pobreza, criminalizando a cor da pele", disse.
Veja abaixo os diversos cenários para porte de maconha para uso pessoal: como é hoje, como será numa eventual descriminalização pelo STF, como será numa eventual aprovação da PEC das Drogas.
A pessoa fica submetida a advertência, prestação de serviços à comunidade e aplicação de medidas educativas (essas duas últimas pelo prazo máximo de cinco meses). Mas não é fichada na Justiça.
A pessoa continuar sem ser fichada e continua sujeita às medidas socioeducativas. Mas o STF vai definir uma quantidade máxima que configura uso pessoal, o que hoje não existe.
Mesmo pequenas quantidades para uso próprio levarão a registro na ficha criminal e a medidas socioeducativas e de tratamento.
Fonte: Da Redação